
NÃO TIRA A CAMISA, JOBSON!
O domingão à tarde se resumiu em futebol na tv. Estirado na cama com a roupa da noite anterior, reparava com olhos cabisbaixos, contudo atentos, aos lances de um nada atraente (até então) Botafogo x São Paulo. Um brigando para não cair e o visitante, buscando mais um título consecutivo, respectivamente. Realidade do calor do Rio de Janeiro misturado a um desgaste dos jogadores em campo, que não convergiam, muito menos combinavam com a minha realidade sob o ar condicionado do quarto. Abduzido de uma moleza, eu mal reagia à locução espalhafatosa do Cléber Machado. Todavia a partida estava emocionante de fato, duas viradas no placar, pontapés, lances bonitos. Eu que estava pra morrer de preguiça, sendo que nenhum dos dois times era o do meu coração de torcedor, uma suposta adrenalina vestida de euforia me vestia no aguardo de um próximo lance a seguir. Aos poucos, pelo roteiro que o jogo despretensioso de um domingo qualquer à tarde tomava como rumo.
Lá perto do final da segunda etapa, o garotinho JOBSON (foto acima) , o nome do jogo, recebeu a chance na cara do gol. Antes de marcar ele ainda entortou o zagueiro de seleção Miranda, disparou um balaço no gol do Rogério Ceni, sem choro nem vela. Explosão de alegria. No estádio e em qual fosse o local onde estivesse algum alvinegro carioca naquele momento. Golaço! Diferente do costume, da situação do jogo! Empolgante inclusive a mim que nada sou do Botafogo nem parente do Jóbson! Levantei num pulo de gato e gritei demais pela janela a fora e forcei as duas mãos com o punho fechado na frente da tela com os joelhos levemente agachados, sem saber por que com aquele GOLO (como diria minha avó Clô) vibrante, contente pelo futebol em si que só ele, quem sabe, pra me despertar naquela tarde tão agradável para não reagir a nada. Um ócio prazeroso! Fiquei então sem explicar, quase tirei a camisa no calor da comemoração. E lamentei, logo em seguida, por não ter tirado no lugar do atacante do Botafogo. Coitado! Recebeu o segundo cartão amarelo e foi expulso por ter sido feliz com seu torcedor da arquibancada amontoado na mureta para vê-lo sem camisa.
Após essa cena me perguntei alto sem querer resposta ou entrar em profundas dialéticas (mentirinha): – Por que cartão amarelo pela comemoração? Mas que barbaridade! Realmente choca. Muitos dirão que o garoto foi burro ao tirar, porque o jogador previamente deveria saber dessa regra, sendo assim, prejudicando sua equipe de maneira premeditada. Só que temos que ponderar o ser humano, ou não (mais)? Permitir transbordar nessas horas apenas quem assiste e torce é covardia. Têm momentos na vida que o natural explode dentro de nós, nato a qualquer um mortal. Precisa sair! Lembra aquela vontade de rolar na areia fina, branquinha e quente quando se é pequeno e, depois arrancar num pique aloprante em direção ao mar, seguido de um pulo de filme escaldante e refrescante em dias de praia com 40 graus na sombra?! É isso que eu me refiro, nesses momentos ninguém pensa, só faz. Imagina se proibissem o beijo roubado? Tô maluco!!! Nesse labirinto de vontade, desejo e necessidade imediata, que circunda nossas cabecinhas pensantes, a felicidade nunca avisa nem manda recado. Simplesmente estoura. Deixem-na ebulir, seus juízes! Aliás, FIFA! Coibi-la com leis, repressões ou safanões teriam a mesma eficácia que se proibissem os torcedores de falarem palavrões no estádio! Banalizar o desnecessário é mais prejudicial e não dá exemplo de nada pra ninguém.
Acabem com a paradinha, não com o tirar de camisa! Pode ter certeza que quem tira a camisa não quer mostrar a tatuagem do filho desenhado na costela (às vezes sim!), mas a grande e amassadora maioria é dos que transbordam em alegria de fato. E falo isso com um dó do meu lado jogador que possuo. Que em meus momentos de raiva no gol costumo esbravejar com um grito de sotaque britânico ‘COME-ON!FUCK OFF' jogando a camisa ao vento ou girando-a sobre a cabeça e indo aos braços da torcida! Nunca fiz um gol na verdade, profissionalmente, em que pudesse comemorar assim. Porém nos meus sonhos essa comemoração é constante! Seja então nos gols decisivos, dos clássicos que pegam fogo, do cara que nunca marcou um gol e mal sabe como comemorar e se atira na grama mesmo de qualquer jeito, que afere qualquer jogador, seja o de várzea ao maior dos artilheiros que goste de guardar dentro das redes: SER COIBÍDO É UMA MERDA! Tanto que até dos próprios companheiros os atacantes fogem quando fazem gol, reparem! Eles querem vibrar livres como pássaros até onde for pra ser. Com ou sem camisa, imitando super heróis ou mostrando mensagens, dançando ou silenciando ao lado da bandeirinha de escanteio.
O espontâneo faz parte do tal do futebol, é na hora do gol que ele deveria se sentir em casa. Os jogadores goleadores felizes estão sendo atenciosamente vigiados e regulados. Tão querendo padronizar até isso! É requisito pra copa a comemoração politicamente correta? Talvez, já que a África e o Brasil possuem população significante suburbana que anda sem camisa pelas ruas porque também não tem o que comer, em condição de miséria. E esse assunto não é levantado apenas por mim, gira à tona em programas esportivos da TV, internet, rádios e jornais a torto e a direita há horas com tom ironia. Infelizmente é só pano pra manga; coluna de Arnaldo Jabores e etc, resenha com o porteiro; pra mesa de bar com os amigos. Nada se resolve assim tão fácil na international board e pouco se entende. Nem na minha casa (família) pelo visto. Em um primeiro momento cheguei a pensar que minha mãe não gostava do Botafogo, pois veio me dar uma dura com direito a dedo indicador apontado e bem esticado na minha direção com direito a cara feia programada mais testa franzida. Aí percebi, tudo porque com minha exagerada comemoração eu tinha acordado meu priminho de 6 meses, que dormia no quarto ao lado. Só que eu não lembrava desse pequeno detalhe.
É, Jóbson...eu também me esqueci! E então, já é meu terceiro amarelo da semana dado pela minha mãe! Será que estou suspenso para o próximo jogo? Vou ser mais contido agora na hora ser feliz, na hora de sonhar, na hora de tirar a camisa...
L.Meira, 22 de novembro de 2009.